Livro filosófico mais delicioso que já lí, ou melhor, estou lendo; a autora é francesa, Muriel Barbery, e conseguiu colocar com doçura crises adolescentes intercaladas com a melancolia adulta. Com muito humor e muita propriedade, ela perpassa por questões do tempo, da beleza, da justiça, da ética, do amor.
Fiquei com vontade de grifar o livro todo, de fazer posters e espalhar por aí, sem destino estabelecido.
"...acho que todo dia é uma nova construção, como se durante a noite tudo tivesse se reduzido a cinzas e fosse preciso recomeçar do zero. Assim se vive a vida do homem, no nosso universo: é preciso reconstruir sem parar a própria identidade de adulto, essa montagem efêmera e capenga, tão frágil, que reveste o desespero e que, quando se está sozinho, olhando para o espelho, conta a mentira em que se deve acreditar."
"...lá fora o mundo ruge ou dorme...e também provamos a sensação de um néctar precioso, o dom maravilhoso de uma manhã insólita em que os gestos mecânicos tomam novo impulso, em que cheirar, beber, repousar, servir de novo, bebericar, equivalem a um novo nascimento. Esses instantes em que se revela a trama da nossa existência, pela força de um ritual que reconduziremos com mais prazer ainda por tê-lo infringido, são parênteses mágicos que deixam o coração a beira da alma, porque, fugaz mas intensamente, um pouco de eternidade veio de repente fecundar o tempo."